sexta-feira, 24 de julho de 2009



fiquei com vontade de escrever um poema sobre o cigarro. todos os poetas-fumantes o fazem: atores, músicos, fotógrafos, cineastas e até as poetizas mais belas - cujas poesias, faladas, cantadas e dançadas impulsionam o meu viver. fiquei pensando que tipo de cativância exerce o cigarro sobre essas cabeças enfumaçadas para inspirar versos tão intensos, tão profundos em sua superficialidade trivial... ou será que o ímpeto de poetizar o cigarro vem da necessidade narcótica de oxigenar nossos eus-líricos com longas e performáticas baforadas? bom, seja o que seje, para além desses devaneios, o resultado dessa pequena empreitada foi esse - poucas palavras no papel... e muitas baganas no cinzeiro...

O solitário

Para mim é odioso seguir e também guiar.
Obedecer? Não! E tampouco - governar!
Quem não é terrível para si, a ninguém inspira terror;
E somente quem inspira terror é capaz de comandar.
Para mim já é odioso comandar a mim mesmo!
Gosto, como os animais da floresta e do mar,
De por algum tempo me perder,
De permanecer num amável recanto a cismar,
E enfim me chamar pela distância,
Seduzindo-me para - voltar a mim.
(Friedrich Nietzsche)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

folha em branco

volto a ti novamente
estranho espelho...
olhos cerrados
os lábios quase sêcos
nada mais de música se ouve
mas cá estou
tentando fazer alguma banda soar
em qualquer algum lugar...

molho os lábios para sentir
abro os olhos para falar
viro de costas para chorar...
se não ela não há eu
se não eu, chôro ainda há seu?

aos que fazem política batendo na mesa

Política não é brincadeira?
Amor não faz política?
se na política não tem amor
a política perde o valor
se não se fizer de brincadeira a política
não sentímos a política
sem sentir não tem viver
assim como nada é vivido sem sentido
e a quem disser que nada tem sentido
digo que todo o sentido esta no amor
o amor que não respeita limites
o amor que não impõe regras
o amor louco insandecido
que tal qual devir-intenso
se alastra por onde quer que haja o menor resquicio de vida
corrompendo as razões
desestrturando organismos
revolvendo raízes
transgredindo fronteiras
justamente por respeitar o direito comum a todos que amam
de se livrarem das suas demarcações...
e brincar, tal qual brinca aquele que rompeu com a norma
e agora sente... vive... ama!
agora sim sabe fazer política....
amar, sentir, romper, fugir, viver
sentir o amor
romper pelo amor
fugir para o amor
viver em amor
lutarbrincarpoliticaramar
Até quando vamos deixar pintarem de branco nossas caras?
até quando vão - sem esboçar nenhum pesar - embranquecer nossas vidas e nossos sonhos?

Pintaram de branco até as grades que nos cercam
dai achamos que sumiram
mas elas estão lá...
...Brancas!
e como tudo que é branco
vão engolindo todas as cores
engolem até
nossa vontade colorida de quebrá-las

epígrafes para pixar nas paredes de nossas cabeças (ou em qualquer outro canto desse mundo)


Se quer provocar liberdade
que vai fazer?
se não quer...
pra que viver?

*
Homos-políticus
Homos-poéticus
Politiquize-se
Poetiquize-se

*
Criar é subverter o que existe. Quem incomoda, resiste.

*

Dois princípios básicos da luta pela liberdade:

1-Se a liberdade provocada não atingir ninguém além de você mesmo, sua luta falhou.

2-Se a liberdade provocada não atingir pelo menos você mesmo, sua luta também falhou.


*

As paredes das nossas vidas estão cheias da arte do vazio bienalística. Preenchâmo-las todas com os vazios de nossas artes!
Ando um pouco sem mim
ainda que longe do fim
por aí, entre indo e vindo
melhor é seguir sentindo

decompondo as malhas
reencontrando as falhas
de nada me serve o tudo
se não tiver o nada pra nascer o novo

fragmentos de um "mea culpa" cínico

Ela tinha me contado que o seu pai era bruxo e que uma vez ele tentou enforcá-la só porque resolveu olhar dentro dos seus olhos. Ela, por sua vez, já tinha tentado esfaquá-lo com palavras. Fiquei com medo de tomar eu as facadas, sem talvez ter me dado conta de todas as facas que eu já tinha atirado por aí. Não podia trepar comigo porque deus não deixava. Minha raiva toda contra ele me cegou do fato de que na verdade eu é que não escutava música suficientemente ruim. Além de que os pêlos - mesmo que incipeientes - da minha maior auto-afirmação de masculinidade e independência feriam seu bom-senso-estético-juvenil. No mais muitas telas de computador foram arremessadas contra a parede, e eu sempre achando que quem o fizesse fossem mão exogenas. Até me aperceber de todos os fins de ano que eu estraçalhei atirando notas de dez reais pró-pilulas-do-dia-seguinte violentamente contra sonhos construidos na areia. Será que foi mais de uma vez que eu fiz confundir Londrina com Floripa? A essas horas a infusão de canela em pó com folhas de louro já corria ligeira para dentro do ralo, junto com a idéia de que um relacionamento aberto era tudo que um garotinho de barba como eu podia querer. Nessas idas e vidas minha cabeça já viajou a Buenos Aires mais de uma vez... nas primeiras, com o medo adolescente de nunca encontrar a teta da primeira mamada; mas já nas segundas, com saudades, e com o desejo animal que fez brotar, feito rizoma, uma teta no meu próprio peito. Quererei eu que essa teta tenha sido sempre minha? Já ia achando que meu pau nunca mais fosse levantar! Ah o pinto duro e os pêlos hirsutos sempre tentando trazer rastros do que eu acho que tem de tão bom nas carreiras cheiradas que não fui eu quem estiquei e nas camas quebradas que eu nunca deitei. Afinal, qual foi mesmo a porra do filósofo que disse que a vida que queremos está sempre atrás da montanha?

Esse sol, esse sol proeminente, central, onipresente. Esse sol em vortex cujas linhas se espalham por todo o canto da cena sugando toda ela para o seu centro devorador de almas. Sugando a energia desses corpos fatigados que aparecem em traços retilíneos, crus e muito secos. Pés cansados, rostos magros, exauridos e com a espressão já quase apagada de tanto caminhar pela vastidão inóspita. A linha contínua que separa o chão do firmamento exala angustia ao refletir um horizonte sem fim, indo muito além de onde a vista alcança. Estamos contemplando um oceano, mas um oceano sem água. Um oceano de terra e sol. Um oceano de morte à espreita. Um oceano de incômodas e frustradas esperanças. Um oceano de vidas vazias, vidas sem vida. Um oceano de vidas sêcas.
na verdade, não gosto de nada que escrevo

sinto que não posso escrever nada
todos já escreveram tanto
parece que tudo o que devia ser dito já o foi
nosso mundo está entupido de palavras
abarrotado de versos
são mesmo demais pra escolher
qual deles você quer ser
às vezes acho que o que precisamos mesmo
é de um pouco menos de

oi, prazer, sou uma pessoa normal...


Pessoas normais buscam vidas normais
pessoas normais num mundo anormal

ainda sonham em achar o normal no meio do mundo

sonham com vidas estáveis...

Eu desprezo tudo que lembra estabilismo

desprezo tudo que me lembra finitudísmo

Pra mim, o contrário!... e sempre o contrário

eu desejo a eterna instabilidade

regozijo-me com o conflito

com a querela gelada que destrói os campos

e faz nascer flores novas

flores novas e diferentes

infinitamente belas em sua efemeridade trágica


Pessoas normais buscam vidas normais

"regras e sistemas" é o nome do que elas buscam

já eu, prefiro me intrometer por entre as brechas desse sistema

enveredar-me pelas falhas dessas regras

e assim aos poucos minar tal binômio congelador de vidas

que venham outros dele!

sempre trarão no seu bojo espiritos

cujo dever (anti)ontológico será destruí-los


Ah as pessoas normais e suas frustrações extra-normais...

logo logo se dão conta do óbvio ululante e ultrajante:

Pessoas normais não existem!!!

mais dia menos dia os seus castelos nababescos

feitos à custa de muito suor e esperança

para servir-lhes de eterna morada quando a labuta tiver fim...

-que será deles?

eis que desabam, simples assim...

as duras e pesadas pedras de estabilidade desmanham como areia

e as ilusões de solidez passam correndo

fugindo do devir que desmantela, destrói e desterritorializa

colocando tudo o que se quer parado no seu estado natural de movimento


Pessoas normais vivem assim em padecimento

o vir-a-ser as assusta


A pessoa normal perde então, uma a uma

as amarras que a prendiam na sua fantasia sediciosa de Deus

Primeira amarra desfeita: perde o "Normal"

Segunda amarra desfeita: perde o próprio "Pessoa"

daí se desprende do firmamento

e se esborracha no chão...

eis seu tão ansiado fim!


Triste não será porém

aquele que, desde sua estadia enganadora no céu

abdica do conforto de suas cordas

e salta ele mesmo de sua nuvem...

também ele cairá

também ele conhecerá no chão seu fim

mas até atingir o solo,

viverÁ em cada instante de sua queda

momentos de eterna alegria